Última Ceia, 30 Anos, (1978-2008).
Luiz Domingos de Luna
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Qual foi a dor do Padre Francisco França, quando no ano de 1978, notificou que havia uma grande fissura na torre Norte da Igreja Matriz de Aurora? Que a cada dia, aumentava. Populares já contavam como certo o desmoronamento, pois os habitantes já não passavam por aquele espaço ameaçado.Na oportunidade, pude presenciar e acompanhar o sofrimento deste grande homem de fé que durante toda sua vida passava para a sociedade à tenacidade, a luta, a garra, a determinação de permear para todos, à unidade social, a civilidade, a religiosidade e a fé. Sempre com o pensamento iluminista, ante uma visão de futuro que envaide a todos nós até hoje. Pois, já naquela época pensava em construir a Concha Acústica de Aurora; como um ponto iniciático para o desenvolvimento da música, da cultura, das artes cênicas, da literatura.Era realmente um grande paradoxo! O homem que idealizou a Concha Acústica de Aurora, ver o seu templo religioso periclitante, pois lenta e constante, a fenda teimava em desafiar o otimismo daquele sonhador numa verdadeira provação de fé. Como discípulo, fiz questão de acompanhar os passos do mestre e verificar as suas ações, diante desta situação vexatória.Foi quando numa bela noite, fui convidado para junto com o venerável mestre, Padre Francisco França, fazer uma visita ao casal Sebastião Alves Pereira Filho - Dr. Bastim e a sua esposa Terezinha Alves Pinto - D. Terezinha. Confesso que fiquei muito surpreso com a naturalidade da conversa, tudo de forma espontânea, de uma racionalidade brilhante, ouvia, atentamente, os dois mestres conversando.Foi quando o padre convidou o casal para solucionar o problema da fissura da torre. Fiquei admirado quando prometeram fazer uma reforma completa na igreja, inclusive mudar o teto que já se encontrava bastante estragado, colocar colunas internas para diminuir a força nas torres e construir um belo altar-mor.Por fim, fazer uma reforma completa. Ora, para mim o conserto da torre já era o bastante, mas fazer uma reforma completa, aí já era demais. Assim, o casal mobilizara seus familiares realizando o sonho que naquele momento parecia ser o sonho de todos os aurorenses - a construção da maior obra artística de Aurora; a ultima ceia no altar-mor da igreja matriz do Menino Deus, que logo em seguida, foi devidamente esculpida pelo escultor aurorense Francisco José de Oliveira (Franzé de Aurora).Passei, a partir daquele momento, a freqüentar todas às noites, contemplando a mudança daquela argamassa disforme em futuras representações de Apóstolos, Jesus Cristo, mesa, adornos; todos os detalhes foram minuciosamente pensados, analisados e polidos.Não tinha pressa! Fora tudo majestosamente feito no silêncio da noite e das madrugadas, eu ficava pensando: como pode tanto zelo! Tanta dedicação! Nenhum fiscal, nenhuma cobrança? Até parece que a obra não tinha prazo para ser entregue. O escultor esculpia de forma serena, lenta, gradual. Observava todos os detalhes. Era como se fosse uma missão, tudo numa tranqüilidade plena. Assim, a obra ficou pronta, linda inclusive! Mas, Dr. Bastim queria um altar em mármore. Mármore puro. Era como se ele já tivesse projetado na mente aquela última Ceia, ainda nos seus verdes anos, assim, tudo foi feito da forma mais natural possível.Dr. Bastim queria mais, pois, para ele a obra não estava acabada, faltava o órgão. A igreja foi fechada e numa bela manhã o padre pediu para que às nove horas em ponto eu estivesse presente na casa Paroquial, quando às 9:30min dois carros pararam em frente a casa paroquial. E o padre me apresentou os benfeitores daquela comissão formada por Dr. Bastim, sua esposa D. Terezinha Alves Pinto, Dr. Wilames, Dr. Danúbio, bem como os Jornalistas Edilmar Norões, João Inácio Júnior, Neno Cavalcanti e Lúcio Brasileiro.Em seguida adentramos a Igreja Matriz. O padre descobriu-o como quem anunciava um sacramento. Estava enfim, realizado o sonho de Dr. Bastim - a Última Ceia, linda! Envernizada, as colunas bem acabadas, o teto novo, o piso da escadaria do altar Tudo de mármore. Aí eu vi um pano vermelho que cobria algo e numa emoção exagerada descobri: era um órgão, novinho em folha.Não me contive diante daquele instrumento fadado a história. Pressionei algumas teclas e o som fluentemente saira. Confesso que nunca havia visto nada igual: Um órgão! Perdi a noção do tempo e do espaço diante das minhas próprias abstrações eclesiásticas. Quando cuidei de mim, estava sozinho na igreja, naquele templo sagrado de Deus, onde a partir de então, a música seria muito mais que uma ponte a nos transportar a seara celestial. Este dia me marcou para sempre, pois tudo era um sonho.Não somente o sonho de Dr. Bastim. Não somente o sonho de Padre França. Não somente o meu sonho, mas o sonho de todo povo de Aurora, materializado a partir daquele instante eterno{…}